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“Existe é homem humano”

08 set

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Riobaldo é poeta e narrador de si mesmo; inventa sendo ele mesmo uma invenção poética. O personagem de João Guimarães Rosa é filho bastardo e único herdeiro de um fazendeiro no interior mineiro, ex-combatente entre jagunços e coronéis de um tempo que aparentemente acabou em nossa cultura. Em alguns momentos do romance aparece a expressão Nonada. Já na primeira linha. É comum pensar que a palavra seria um neologismo; mas não é.

Termo do português arcaico, nonada pode ser utilizado para referir-se tanto a alguém (um “zé-ninguém”) como a algo (sem valor ou insignificante). De acordo com dicionários contemporâneos, vem de uma redução do latim “res non nata” e quer dizer literalmente “coisa de não nascido”. Seu significado pode variar de acordo com o contexto em que atua como adjetivo para “pessoas não nascidas em prole abastada” ou para assuntos de “menor importância ou valor”.

Nonada, não-nada, ninharia, bagatela. Darcy Ribeiro em O Povo Brasileiro refere-se aos primeiros “brasileiros” nascidos em território “nacional” como “nonadas”. Nem portugueses, nem índios ou africanos, ainda não eram brasileiros, porque o país ainda estava por ser inventado. Nonada: coisa de nenhum ser. Nonadas eram os despossuídos, os que eram considerados como mestiços e se viram forçados a inventar, ao longo de décadas, sua própria e plural identidade étnica (a do brasileiro) a partir de heranças miscigenadas e do encontro com a diversidade de geografias de cada localidade.

Em Grande Sertão: veredas, mais ao final da obra narrada e protagonizada por Riobaldo, que diz ao leitor/ouvinte/espectador:

“O senhor é um homem soberano, circunspecto. Amigos somos. Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se for… Existe é homem humano. Travessia.” (p.608)

Adotamos o termo Nonada e depois Nonata como eixo norteador para o trabalho que necessitamos desenvolver enquanto artistas-pesquisadores. Nonata ou Non Nata (o “não nascido”) fornece contornos para a trajetória que estamos percorrendo, buscando o Novo; os novos encontros, os novos trabalhos, as novas formas de auto expressar, resultando em obras ou ações singulares. Não massificar. Singularizar.

Nonata Cia de Arte para nós significa uma postura reativa a ser tomada diante da vida: não ao nada, não ao vazio de desejos e afetos, sim ao movimento, ao processo continuado de aprendizagens, na medida em que pouco pode representar bem mais que nada. Ainda que o nada seja parte essencial do fazer artístico, enquanto uma instância, um estado de passagem, “é preciso estar atento ao movimento”, como afirma Ítalo Calvino, em As cidades invisíveis (1972).

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Publicado por em 8 08America/Sao_Paulo setembro 08America/Sao_Paulo 2016 em GRANDE SERTÃO

 

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